11 de dezembro de 2015

Adauto Domingues

Eu sou meio suspeito pra falar do Adauto, uma vez que, fui treinado por ele durante os anos de 95, 96, 97 e posso afirmar com toda certeza, foi a época em que mais evoluí. No ano de 1995 eu já estava trabalhando nos Correios e a empresa criou um programa beneficiando os atletas que melhores se destacavam nas competições para representá-la em competições de nível nacional, cada estado tinha seus atletas integrantes da equipe. A equipe de São Paulo era composta por 5 integrantes e como treinador foi contratado o "Adauto Domingues", eu já o conhecia pq acompanhei por muito tempo seus resultados através da televisão, jornais, e revistas, mas nunca tive a oportunidade de conversar com ele pessoalmente. Lembro do dia em que ele foi nos apresentado como treinador lá nos Correios central da Vila Leopoldina, foi um dia muito especial pra mim, pois eu estava na frente de um grande atleta que eu admirava demais. Nessa época eu estava me recuperando de uma lesão que já durava 6 meses, expliquei a situação pro Adauto e com toda calma e segurança do mundo ele disse que eu poderia ficar sossegado que isso não seria problema, com isso ele já tinha ganhado um fã kkk.
A partir desse momento eu comecei me recuperar, fui encaixando os treinamentos e melhorando pouco a pouco. Eu nunca fui atleta de elite, mas durante o tempo em que treinei com o Adauto tive uma melhora significativa e tive a certeza da importância do "treinador" na vida do atleta. Tenho muito carinho pelo Adauto, pois além dele ser um ótimo treinador é também um grande ser humano.

Pra vocês conhecerem um pouco mais desse extraordinário atleta vou postar alguns trechos de uma entrevista que ele concedeu pra repórter e corredora Fernanda Paradizo em agosto de 2012.


Por Fernanda Paradizo
Muita gente o conhece hoje como o técnico do Marilson dos Santos, mas Adauto Domingues, de 51 anos, tem uma história diferenciada e escreveu seu nome no atletismo nas décadas de 80 e 90. Bicampeão pan-americano nos 3.000 m com obstáculos, ele representou o Brasil nos Jogos Olímpicos de Seul, em 1988, venceu sete vezes seguidas o Troféu Brasil de Atletismo e dominou por 10 anos as provas de pista por aqui, dos 1500 m aos 5000 m.

Você começou cedo na corrida de rua. Como foi esse ingresso? Eu tinha 9 anos. Existe uma entidade filantrópica em São Caetano do Sul chamada Patrulheiros Mirim (na época, Guarda Mirim). Eu passava muito tempo na rua jogando bola e minha mãe colocou meu irmão e eu nessa entidade. Havia duas coisas paralelas: as aulas de Educação Física e a banda (ou fanfarra). Ou você entrava para a banda ou ia para o esporte, ou para as duas coisas, como aconteceu comigo. Como não havia verba para esporte coletivo, como montar jogo de camisa e tudo mais, era mais fácil correr. Eu corria quase todas as provinhas. E todas as distâncias, até velocidade. No início, eram provas de garotada. Em paralelo a isso, eu levava a música. Toco sax ainda hoje devido a isso, e por partitura. Chegou um momento em que comecei a me destacar na corrida. Fazia alguns treinos onde joga hoje o São Caetano. Coincidentemente, o diretor do atletismo do Sesi de Santo André, Armando Corujeira, morava em frente ao estádio. Ele me viu treinando e me convidou para treinar com o professor Asdrúbal Baptista. Eu tinha 17 para 18 anos e uns 300 troféus em casa, mas quase não treinava. Só corria as provas. Quando ele me convidou, eu estava na época do Exército. "Se você for dispensado, você vem para o clube", ele disse. Meu pai tinha falecido em 1979 e minha mãe vivia só da aposentadoria e algumas coisas que fazia. Meu irmão também trabalhava. Eu tinha feito Senai e era metalúrgico. Não havia muito desemprego na época e minha mãe falou: "Pelo que você ganha agora, tenta um ou dois anos. Se der certo, você continua. Se não der, volta a trabalhar". Arrisquei. Acabei nem ficando no Sesi de início. Me colocaram no projeto "Adote um Atleta" e eu recebia um valor para isso. Passei a treinar no período da manhã no Centro Olímpico com o Carlão (Carlos Gomes Ventura). Entrei em abril ou março e já no final do ano tinha evoluído muito. No ano seguinte, havia terminado o 2º grau e fazia faculdade na parte da manhã. Tive que transferir o treino para tarde e passei a treinar com o professor De José (Francisco de José, o DJ). Fui melhorando ainda mais os resultados. Em 1982, já fui 2º nos 1500 m do Troféu Brasil.


Quando e como o 3.000 m com obstáculo entrou na sua vida? Foi por acaso. Em 1983, ano do Pan de Caracas, eu corria 1500, 5000 m e provas de rua, e houve um Campeonato Universitário no Ibirapuera. Eu ia correr os 800 m, às 11h; deu 12h30 e nada; estava tudo atrasado. Eu estava com fome e resolvi ver o que tinha de prova mais tarde para poder almoçar. Só tinha 3000 m com obstáculo. Pedi para me colocar nessa prova porque queria almoçar. Tinha 9:27 como melhor marca, o que era ruim, mas acabei vencendo em 8:59. Depois acabei entrando na prova no Troféu Brasil e ganhei com 8:45.03. Era índice para o Pan, mas já fora do prazo. Como prêmio de consolação, fui levado para correr o Ibero, em Barcelona, e fiz 8:40. Entrei meio sem querer e num espaço muito rápido melhorei muito minha marca.
A partir daí e especialmente em 1985 aconteceu muita coisa boa na sua carreira. Em 85 tive um salto de qualidade. Fui para o Campeonato Mundial Universitário e bati o recorde brasileiro, com 8:32, que durava 10 anos e era do José Romão. Fui 4º. Foi um baita resultado. Eu cheguei a ficar em 20º no mundo. Depois, em 1992, o Clodoaldo do Carmo bateu meu recorde, com 8:19. Ganhei sete vezes seguidas o Troféu Brasil, de 83 a 89. Foi um ano muito bom. Fui 3º na São Silvestre, no ano em que o José João ganhou e o Rolando Vera foi o 2º. Foi meu melhor resultado na São Silvestre; até então tinha um 8º lugar. Com 24 anos, comecei a me estabilizar como atleta.


No Pan de Indianápolis, você foi ouro nos 3000 m com obstáculo e prata nos 5000 m. Como foi sua trajetória até chegar aos Jogos Olímpicos de Seul e ao Pan de Havana? Em Indianápolis 87, ganhei do grande nome da época no obstáculo, que era o americano Henry Marsh. Era o 4º ou 5º do mundo e tinha 8:09. Fiz 8:23, bati o recorde pan-americano e novamente o brasileiro. Foi minha melhor marca pessoal. A prata nos 5000 m veio dois dias depois; perdi para o mexicano Arturo Barrios. Nesse mesmo ano fui 5º na São Silvestre. E veio 1988, ano olímpico. Nunca tinha tido lesão e nesse ano tive uma no joelho. Perdi muito treino. Não estava mal, mas não conseguia recuperar. Passei na preliminar e fiquei na semifinal. Já em 1991, no Pan de Havana, fui como favorito. O Clodoaldo (Lopes do Carmo) tentou fazer o índice na Europa e eu, que estava machucado, optei por fazer aqui. Só eu consegui. Uma coisa boa da época era que as provas não eram fracas aqui no Brasil. Nosso obstáculo tinha muita qualidade e isso ajudava a evoluir. Infelizmente, é algo que não aconteceu com o Marilson, que ficou sem ter adversário local que gerasse essa competitividade.


Você conseguiu grandes resultados na pista, mas antes disso chegou a correr muitas provas de rua.Eu tinha facilidade para correr na rua, porque eu vinha da rua. Eu entrava em quase todas e me dava bem, em parte porque a elite da época era um pouco mais velha que eu. No período em que tive a evolução das minhas marcas na pista, ganhei duas ou três Gonzaguinhas, subi quatro vezes ao pódio da São Silvestre e cheguei a correr uma meia em São Paulo em 1:02:50, o que para mim, que treinava para 1500 m e obstáculo, era muito bom.


Quando você parou de competir e virou treinador? O Asdrúbal faleceu em 1992. Fiquei 10 anos treinando com ele. Eu já era formado e mantinha o trabalho na Prefeitura. Como eu era o mais velho ali, fui chamado para ajudar com os meninos, entre eles o Clodoaldo (Gomes da Silva) e o Marilson (Gomes dos Santos), que era bem novinho, tinha 15 anos. Chegou de Brasília para treinar no Sesi com o Asdrúbal e ele faleceu. Daí convidaram o DJ para ser treinador. Eu era atleta ainda, estava com 31 anos e o DJ sugeriu que eu ficasse com o grupo de 800 m, 1.500 m e obstáculo e ele com o grupo maior, de fundo (5.000 m, 1000 m, meia-maratona e maratona). Quando o Hudson de Souza veio, ele caiu nesse grupo comigo. O Clodoaldo e o Marilson ficaram com o DJ. Eu treinava com o grupo de fundo e fazia as planilhas para o outro grupo, com a ajuda do DJ. Quando ele saiu, voltei a assumir o grupo todo, mesmo sendo atleta ainda. Até o dia em que tomei um "chapéu" do Marilson numa prova de 10000 m na pista. Aí resolvi parar. Foi em 1996. O Marilson tinha 19 anos, mas era um cara diferenciado desde cedo. Tanto ele quanto o Clodoaldo pegaram tudo o que você possa imaginar de Seleção. Levei esse grupo um tempo também como atleta, mas minhas lesões foram ficando mais próximas uma da outra. Não sei se eu gostava de competir. Gostava de ganhar. Comecei a perder e isso me incomodou um pouco, até porque fiquei 10 anos sem perder no Brasil, dos 1.500 m a 5.000 m.


Não temos nenhum representante nos Jogos de Londres dos 1500 m aos 10000 m. O que podemos esperar para 2016, aqui no Brasil? Temos um bom grupo surgindo e vamos ter vários, mas vai demorar um pouco mais. Alguns dos atletas hoje dos 800 m vão correr um bom 1500 m. Há dois meninos bons, os gêmeos Gilberto e Gilmar Lopes, que treinam com o Henrique Viana. O problema é que perdemos uma lacuna grande e temos que encurtar isso. Quando acontece isso, você perde gerações e tem que trabalhar para recuperar. O que não podemos deixar acontecer é perder a geração que está vindo.

A entrevista completa pode ser encontra na edição 277 – Revista Contra-Relógio - agosto – 2012 -FERNADA PARADIZO.
Abaixo alguns resultados internacionais de Adauto Domingues.
1983
Ibero-Americano – Barcelona - Espanha / 3000m com obstáculo – 3º col - 8:40’17”
Campeonato Sul-Americano – Santa Fé- Argentina / 3000m com obstáculo – 3º col – 8:50,8 
1985
Campeonato Sul Americano – Santiago – Chile / 3000m com obstáculo – 1º col – 8:44,38
1986
Ibero-Americana Campeonato –  Havana, Cuba / 5000m – 2º col – 13:50,36
                                                      /3000m com obstáculo – 1º col- 8:31,91
1987
Jogos Pan-Americanos – Indianápolis, Estados Unidos / 5000m – 2º col – 13:46,41
                                                               /3000m com obstáculos – 1º col – 8:23,26
1989
Campeonato Sul Americano – Medellin, Colômbia /3000m com obstáculo – 1º col – 8:49,2
1991
Jogos Pan-Americano – Havana, Cuba /3000m com obstáculo – 1º col – 8:36,01
Campeonato Sul-Americano – Manaus, Brasil / 3000m com obstáculo – 1º col – 8:36,21
1993
Campeonato Sul Americano – Lima, Peru /3000m com obstáculo – 1º col – 8:36,90 



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